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08 de agosto 2023 •

CNRD publica Portaria regulamentando tratamento coletivo de débitos

Por Joana Bontempo e Pedro Henrique Mendonça

A Câmara Nacional de Resolução de Disputas (“CNRD”) da Confederação Brasileira de Futebol (“CBF”) publicou recentemente a Portaria nº 13/2023, que trata do processamento de planos coletivos para equacionamento conjunto de débitos sujeitos à jurisdição da CNRD (“Plano Coletivo”). O normativo regulamenta e detalha mecanismo que já havia sido anteriormente previsto no artigo 42, § 6ª-A do Regulamento da CNRD.

O tratamento coletivo de débitos sujeitos à jurisdição da CNRD se insere no atual contexto do futebol brasileiro, marcado pela reestruturação financeira e societária de diversos clubes. Esse movimento foi acelerado especialmente a partir da publicação da Lei nº 14.193/2021 (“Lei da SAF”), que autoriza expressamente os clubes, ainda que constituídos sob a forma de associações civis, a ajuizarem Recuperação Judicial (“RJ”), Recuperação Extrajudicial (“RE”) ou Regime Centralizado de Execuções (“RCE”).

Joana Bontempo, consultora do CSMV especializada na área de Reestruturação Empresarial e Falências, ressalta que “o Plano Coletivo permite ao clube a reestruturação de seu passivo sujeito à jurisdição da CNRD de forma organizada e compatível com eventual processo judicial de reestruturação, o que tende a preservar a competência regulatória da CNRD, em harmonia com eventual juízo responsável pela reestruturação do clube, facilitando uma solução negociada com os credores”.

A Portaria nº 13/2023 estabelece que compete ao devedor requerer a instauração do Plano Coletivo. Para tanto, o devedor deve justificar a necessidade de tratamento coletivo dos débitos, indicar a lista de processos (e respectivos créditos) que deseja tratar nesse âmbito e apresentar a proposta de pagamento coletivo. A Portaria prevê também a possibilidade de que o Plano Coletivo estipule pagamentos independentes ou pagamentos por lista de prioridades de credores, o que permite ao devedor melhor adequação do fluxo de pagamentos à sua capacidade econômico-financeira e às regras aplicáveis a eventual reestruturação judicial em curso (RJ, RE ou RCE). Em qualquer caso, a Portaria assegura que nenhum devedor poderá impor aos credores deságio sobre os créditos sujeitos ao Plano Coletivo.

Segundo informado no preâmbulo da própria Portaria, até o momento há 8 (oito) Planos Coletivos em processamento, “abarcando mais de 250 processos e cerca de R$ 170 milhões em dívidas”. Assim, a centralização da fiscalização do cumprimento de planos de pagamento coletivos em um único processo por devedor tende a reduzir significativamente a quantidade de processos em trâmite perante a CNRD.

“A Portaria confere maior segurança jurídica aos envolvidos nos Planos Coletivos, tanto devedores quanto credores; além disso, ao proporcionar a redução da quantidade de processos em trâmite, pode contribuir também para a celeridade no processamento das demandas submetidas à CNRD, em benefício de todos os atletas, clubes e intermediários”, destaca Pedro Henrique Mendonça, associado do CSMV especializado em Direito Desportivo.

Vale ressaltar que o processamento coletivo de débitos não afasta a possibilidade de aplicação de sanções aos devedores que descumpram os termos do Plano Coletivo. Como expressamente dispõe a Portaria nº 13/2023, “o inadimplemento de obrigação prevista no plano coletivo submete o devedor a aplicação de sanções” na forma do Regulamento da CNRD.

Confira abaixo as principais previsões contidas na Portaria:

  • o processamento de um Plano Coletivo depende de iniciativa do devedor, que deverá (i) expor os motivos pelos quais é necessário o tratamento coletivo de seus débitos; (ii) indicar os processos individuais cujos créditos pretende equacionar por meio do Plano Coletivo; e (iii) informar os valores dos respectivos créditos, atualizados até 5 dias antes do pedido ou até a data do ajuizamento da RJ (se for o caso);
  • o credor será intimado no processo individual e poderá impugnar o valor do crédito informado pelo devedor, apresentando justificativa e memória de cálculo;
  • em caso de divergência entre devedor e credor quanto ao valor do crédito, o Painel julgador do respectivo processo individual definirá o montante;
  • uma vez definido o valor do crédito, a Secretaria da CNRD deve emitir a respectiva certidão e encaminhá-la ao processo por meio do qual tramita o Plano Coletivo;
  • o Plano Coletivo poderá prever pagamentos independentes aos credores (i.e. destinação de valor específico ou de percentual do crédito por credor) ou pagamento por lista de prioridades (i.e. destinação de valor fixo para distribuição com critérios objetivos de prioridade, observado o limite máximo de 25% por credor por mês);
  • o Plano Coletivo deverá vir acompanhado de um estudo de viabilidade financeira e uma declaração de que o fluxo de pagamentos é previsível e pode ser cumprido;
  • o Painel julgador do processo por meio do qual tramita o Plano Coletivo poderá suspender preliminarmente a aplicação de sanções pelo prazo de 90 dias, prorrogável por mais 90 dias, antes de se consolidar o plano de pagamentos;
  • após o deferimento do Plano Coletivo pela CNRD, somente se admite a inclusão de novos credores nos casos em que o Plano Coletivo preveja pagamentos independentes, não sendo possível nas hipóteses de pagamento por lista de prioridades;
  • é vedada a imposição de deságio sobre o valor do crédito;
  • os pagamentos deverão ser realizados diretamente pelo devedor aos credores, sem intermediação da CNRD;
  • devedor e credor podem negociar individualmente condições e pagamentos de forma distinta à prevista no Plano Coletivo para extinguir o crédito correspondente, desde que (i) tal medida não afete o fluxo de pagamentos do Plano Coletivo; e (ii) haja benefício indireto aos demais credores;
  • em caso de inadimplemento do Plano Coletivo, o devedor ficará sujeito à aplicação de sanções, inclusive transfer ban.

O CSMV Advogados conta com equipes especializadas dedicadas às áreas de Esportes e de Reestruturação Empresarial e Falências. Ficamos à disposição para auxiliá-los no que toca a dúvidas ou comentários sobre o tema, bem como a consultas e procedimentos relacionados à CNRD e à reestruturação de clubes.